Updates from Fevereiro, 2015 Toggle Comment Threads | Atalhos de teclado

  • nunorosmaninho 09:34 on 27/02/2015 Permalink | Responder  

    E passar por Águeda? 

    Vou realizar o milagre da concisão: pôr em apenas uma nota as incidências gerais da prova Lisboa-Coimbra e noutra a prestação de Joaquim Rosmaninho. Não vos minto. Mil ocupações impediram-me de estar presente. Nem a ajuda do Anastácio me salvou. Águeda era o nome da minha avó materna, a quem o marido, o Maneco, de quem já falámos, aludia com humor quando não conseguia tempo para assistir a uma corrida nas redondezas.
    – Então Maneco, não vai às corridas? – Perguntavam os fregueses da mercearia, admirados por vê-lo atrás do balcão da mercearia à hora em que no antigo velódromo de Sangalhos decorria aquilo a que hoje se poderia chamar um «evento velocipédico». E ele, matreiro e bem-disposto, respondia com uma tristeza velada:
    – Eu ir, ia. Mas e passar por Águeda?
    Toda a gente entendia. Os leitores destas linhas, não. E nesse caso, se estivessem na loja a comprar um pacotinho de colorau e meio quilo de açúcar amarelo, talvez fizessem uma pergunta parva:
    – Porque é que vai a Águeda para chegar a Sangalhos?
    Isso daria um indizível prazer ao meu avô que riria muito, contaria a história aos amigos e lhe ficaria grato pelo divertimento. Claro que Águeda se situa muito para lá de Sangalhos. Nada do que sucedesse naquela cidade poderia impedi-lo de apreciar o seu amado ciclismo ali tão perto. A avó Águeda é que não podia, sozinha, em certas tardes de maior azáfama, vender o colorau, o arroz e o azeite, atender os fornecedores e contabilizar os impulsos telefónicos que davam urgência às conversas na cabine de madeira vermelha.
    Se me perguntassem por que não fui ver a corrida Lisboa-Coimbra, poderia responder como o avô Maneco:

    • E passar por Águeda?

    Só que neste caso, o colorau são as aulas, o arroz capítulos para rever e o azeite o próprio José Luciano de Castro que posto em sossego estava antes das comemorações centenárias. Acho que isto não soou muito bem, mas é tarde para mudar.
    A única coisa certa dos milagres é serem muito duvidosos. Prometi um em dez linhas e derramei trinta sem chegar a entrar na matéria do prodígio.

     
    • António 00:00 on 28/02/2015 Permalink | Responder

      Ex.mo Senhor Escrivão
      Muito obrigado pelas suas palavras, que sei serem escritas com bastante emoção.
      Águeda Pires da Cunha… saudosos tempos!!!
      Um indizível prazer teria certamente o seu avô, quando lhe pediam meio quilo de açúcar amarelo, ao que ele respondia:
      – Açúcar amarelo, de qual do doce?
      Ou quando lhe pediam meio quilo de sal, ao que ele respondia :
      – Sal, de qual do salgado?
      Bons tempos…
      Em relação ao seu azeite, ou seja o Colóquio de Homenagem a José Luciano de Castro com o tema “Anadia de José Luciano de Castro “, tenha a certeza que a sua intervenção será excelente..
      Mas voltemos ao que importa, as incidências gerais da prova Lisboa-Coimbra.
      Bem Haja.

  • nunorosmaninho 09:15 on 26/02/2015 Permalink | Responder  

    Figueira da Foz, 8 de Setembro de 1984 

    Caros amigos biciclistas,
    Encontrei um papel velho de trinta anos onde registei um episódio ao qual periodicamente aludo quando quero comparar as antigas forças com as fraquezas de agora. Data de 12 de Setembro de 1984, uma quarta-feira, e apresenta o teor que se segue.
    Sábado passado, dia 8, após uma manhã de trabalho nas termas da Curia, pedalei até à Figueira da Foz. Saí às 12h10 com muito calor. Ao fim de 34 minutos, estava em Cantanhede. Para chegar à Tocha, demorei mais 39. E decorridos outros 46, cruzei a placa toponímica da Figueira. Cheguei portanto às 14h09.
    Como sabem, faz parte da história ter-me enganado no caminho à saída de Cantanhede. É provável que noutras ocasiões, com o Rui e o Paulinho, nos tenhamos aproximado deste tempo porque na mesma folha se alude a uma tirada anterior em duas horas e vinte minutos. Isto é quase tão remoto como as corridas de Joaquim Rosmaninho!

     
    • ruigodinho1962 16:23 on 26/02/2015 Permalink | Responder

      Vinte anos?!… Era bom, era!… O papel até poderá ter essa idade, mas para a viagem teremos que acrescentar outros 10! O tempo é inclemente!!!

    • nunorosmaninho 16:34 on 26/02/2015 Permalink | Responder

      Nunca fui bom a matemática e agora é tarde para corrigir a vocação. Acrescentei outros dez quando dei conta do lapso, mas ainda leste na versão errada. O tempo é ridículo.

    • nunorosmaninho 16:39 on 26/02/2015 Permalink | Responder

      O que prova que os erros são difíceis de remir.

    • Paulinho 21:33 on 26/02/2015 Permalink | Responder

      Bom na matemática eu também não sou, mas a uma conclusão eu cheguei: vocês estão velhos!!!!

    • nunorosmaninho 10:01 on 27/02/2015 Permalink | Responder

      Tem o Paulinho muita razão e ainda maior crueldade. O leitor puramente internético é que talvez fique sem saber se o Paulinho de 1984 é o mesmo das viagens cíclicas de agora. Faltam fotografias e apontamentos. Pela minha parte, não tenho mais nada.

  • nunorosmaninho 11:35 on 24/02/2015 Permalink | Responder  

    A morte por cem contos 

    Está na hora de nos despedirmos do Cerveira da Mealhada. Aqui vai uma última falcatrua para sua eterna glória. Contém um seguro de vida, febre-amarela e medo. Estou grato ao padre Moisés Nora por esta última história, assim tão sugestivamente contada:
    «Um outro caso engraçado da vida acidentada do nosso grande Chico, faz com que ainda aqui não parem os seus feitos capciosamente heróicos.
    Vai ao Rio de Janeiro, entra na grande companhia de seguros de vida Sul América, e requisita o seu seguro.
    Chamam-se médicos que concordam no seu bom estado sanitário. Toma apólices no valor de cem contos; paga a primeira prestação trimestral, e retira-se.
    Até aqui tudo muito simples e tudo também vai às mil maravilhas.
    Passam alguns meses e Chico Cerveira pagou nova prestação do seu seguro de vida em cem contos, – o que mais lhe fez arreigar os seus créditos perante a Sul América.
    Pouco depois do pagamento da segunda prestação, Cerveira compra um caixão muito bem preparado, enche um saco de areia, coloca-lho dentro, e fez-se anunciar (com nome suposto) ter morrido de febre-amarela. O público ficou logo com um medo dos diabos, fecharam o caixão, lacraram-no e lá vai para debaixo dos torrões, mandando o morto receber, por um indivíduo (este indivíduo é de Ançã onde reside actualmente com fama de capitalista) que era seu conivente na manobra desta tão requintada escroquerie, a quantia do seguro, ao Rio.
    Tudo lhe foi pago pontualmente.
    O morto mudou logo de terras. Deixou esquecer o caso; porém, como o diabo tem uma capa com que cobre e outra com que descobre, mais tarde teve Chico Cerveira de ir ao Rio de Janeiro, onde um dos empregados da Sul América, reconhecendo-o, exclamou boquiaberto:
    – Olá!… Então tu ressuscitaste?…
    Gazofilaram-no logo, procederam a averiguações, desenterraram o caixão, e só então é que se viram logrados quando observaram que o cadáver do grande Chico estava ali substituído por um saco de areia!!!
    Como o autor da comédia era dos que sempre por aqui foram considerados como homem sem pátria nem lar, e como na cadeia só querem que[m] usufrua bagalhoça, puseram-no fora… perdoando-lhe.
    Mas, perguntar-me-ão os leitores: em que consumiria aquele homem tanto dinheiro?
    Não sabemos. O que é certo é que, neste intervalo de liberdade, tratou mais acirradamente de fabricante e passador de notas falsas; e, como as falsificava muito bem, agora já não se escondia da autoridade, afirmando pública e atrevidamente: – que as notas por ele fabricadas eram muito mais perfeitas do que as do Governo (e até certo ponto tinha razão…!).
    A que chegam as condições de um homem perdido…!
    E, na verdade, quem as via, se por um lado tinha receio, por outro lado muitas vezes ficava arrependido de não possuir aquelas lindas pelêgas!!
    Enganou muita gente; porém nunca conseguiu arranjar vida. E não admira, porque está escrito que só nos aproveitará o pão ganho com o suor a escorrer-nos pela fronte, e à força de um trabalho honrado e digno.
    Como saco de areia e o caixão lhe foram pagos pela companhia Sul América, e já pouco angariava com a arte das notas falsas, tentou de novo e com outro nome segurar a vida, mas agora com desastrado êxito. Foi esta tentativa a sua perdição!
    Estava já quase tudo concluído quando foi preso, enclausurado e arremessado de encontro às escancaradas goelas de uma enxovia infecta da cadeia de São Paulo, onde tem estado há meses, e onde morreu no dia 22 do corrente, sem ter a aljofrar-lhe a fronte uma palavra de amigo, uma lágrima de amor e… longe dos afectos da família e das carícias da pátria!
    O futuro fará a sua história, e fará também justiça àquele que sempre sentia uma glória indescritível quando intrujava a triste humanidade.
    Deus e os homens te perdoem, pobre Chico, que eu já há muito te perdoei os calafrios e as noites perdidas por que também desalmadamente me fizeste passar, falsificando admiravelmente a minha firma quando eu era pároco de Cadima.
    É que Deus, não dormindo, vigia e protege sempre os inocentes!
    Porto Ferreira, 27-3-1903.
    Padre Moisés Nora»

     
  • nunorosmaninho 10:22 on 23/02/2015 Permalink | Responder  

    Discretos elogios – Portomar, 22 de Fevereiro de 2015 

    Anunciava-se para hoje menos vento, mais frio e as ausências do Lenhador e do Físico. O sol da manhã correu os céus, os ciclistas as estradas da Mata, Horta, Vilarinho e assim por diante. Um alegre cachorro acompanhou-os durante dois quilómetros, cruzando a estrada, desprezando os automóveis, prometendo a cada instante provocar a queda de alguém.
    Não houve frio, nem vento, apenas as subidas e descidas, uma jornada tranquila. O Paulinho tem notado que as manhãs já não dão para a volta por Cantanhede. Para acalmar os seus justos protestos, fizeram a ladeira do Bolho para Sepins.
    O senhor José da Fonte não pára. A sua passagem foi devidamente saudada. Traçaram-se planos para comer barriga de leitão em Santa Catarina, um pitéu sublime que o Paulinho enalteceu como uma religião, ao ponto de quase esquecer a nata. Houve projectos de subir o Moinho do Pisco amanhã. O Escrivão ameaçou exercitar a segunda variante dos abdominais sentados. E foi firmemente demovido. Em Ventosa, cruzaram-se com colegas prestes a consumar cem quilómetros. Lá ia o Jorge que, à tarde, na tertúlia do Café Camelo, explicou as incidências da sua viagem. Destaco as velocidades de sessenta quilómetros no plano e uma queda. A primeira ocorrência é admirável. A outra dispensava-se.

     
  • nunorosmaninho 15:21 on 21/02/2015 Permalink | Responder  

    Ias buscar lã e ficaste tosquiado 

    O padre Moisés Nora é um mestre da narrativa. Hoje temos uma nota extensa. Primeiro, o pároco evoca a fuga da prisão de Cantanhede, onde se observa certo requinte à Rocambole. A seguir, conta o episódio culminante de Chico Cerveira no Brasil: a compra de uma junta de bois. Que maravilhosa burla! Que enredo! Que subtileza de concepção! E não é teatro, não é ficção. Aproveitem. Mas leiam devagar. Meditem. Deixem-se surpreender.
    «Pouco tempo depois encontro-o envolvido nos tão propalados passaportes falsos dos governos civis de Aveiro e Coimbra, e na tão falada escritura falsa na herança do Visconde da Aguieira, em que ele desempenhou o seu papel com perícia de mestre.
    É que ele era ao mesmo tempo um hábil, um perigoso e um artista.
    Mais tarde vejo-o preso nas cadeias de Cantanhede, onde (como todos sabem), esteve pouco tempo por ter a habilidade de levar o carcereiro no embrulho da sua fuga, o que não o intimidou a usar da delicadeza de até se despedir por escrito dos ex.mos juiz e delegado.
    Com esta despedida um pouco à francesa, ei-lo em campo por esses mares fora, não tardando muito que, à surrelfa, sem ninguém dar por isso, o vejamos residente no Estado de Minas, Brasil, a dois passos de onde escrevo, e onde logo começou a dar expansão ao seu génio requintadamente aventureiro.
    A região presta-se. Assentou barraca e… principiou a trabalhar.
    Desta vez foi um padre o primeiro a ser burlado (o que é para admirar!…). Mas foi muito bem feito, porque primeiramente era o padre que queria intrujar o Chico Cerveira.
    Porém… meteu-se com má rolha…! Eis o caso.
    O padre tinha uma boiada, cuja venda anunciou. Chico Cerveira leu o anúncio, e enfarpelando-se com um traje de verdadeiro caipira negociante, chapéu largo e desabado, calça de peles e modos atabalhoados, assim se apresentou ao padre para lhe comprar os bois. Fizeram negócio, a muito custo, por oito contos. Passou sinal; e, como não trazia o dinheiro todo, disse ao padre que ao outro dia viria com os camaradas (criados) para levarem a boiada, e tudo pagaria.
    No dia seguinte apareceu efectivamente Chico Cerveira, fingindo-se muito embriagado e conduzindo no bolso dezoito contos de réis em notas falsas de cem mil réis.
    Ao entrar em casa do padre, Cerveira puxou logo por todo o dinheiro, dizendo abrutada e labregamente: – «Aqui estão os seus oito contos. O reverendo devia-me tirar alguma cousa; no entanto está feito o contrato. Tome lá, tire o seu dinheiro, e vou mandar retirar o gado.» O que fez.
    O padre, vendo na mão todas aquelas lindas notas de cem mil réis, e vendo também o comprador muito esquinado, deixou-o voltar e obrigou-o a ele mesmo fazer a conta.
    O padre atestou ainda mais o Chico que por fim começou a contar as notas de cem mil réis por notas de cinquenta!
    Bem apanhada… que estratagema tão bem pensado…!
    O padre, calado, foi recebendo, até que por fim, quando chegaram a completar os oito contos, tinha o vendedor recebido dezasseis contos em notas de cem mil réis perfeitamente falsas.
    O Cerveira, que, fingindo-se propositadamente embriagado, tinha mais juízo do que o lorpa do vendedor (que logo deveria ter compreendido ser galinha gorda para maltês…), exigiu-lhe no fim um recibo legal em como estava pago de oito contos de réis da compra da boiada, e cujo pagamento lhe havia feito ele Cerveira em notas de cinquenta mil réis.
    O padre, que havia recolhido triunfantemente ao bolso os cobres e que dava pulinhos de contente, não tergiversou em logo passar o recibo nas condições apontadas. Comprador e vendedor molharam outra vez a palavra, e lá vai o amigo Cerveira com uma boiada a cão, fazendo figas ao padre, que, julgando enganá-lo, apenas lhe deixou trazer dois contos em notas falsas, atirando-lhe como paga final o: mas, talvez te escreva…
    Ao outro dia o vendedor comprou não sei o quê e pagou com uma nota das que recebeu. Porém – oh céus! – caiu das nuvens quando lha recusaram e disseram que era falsa!!!
    Houve logo ordem de prisão, um barulho dos diabos com telegramas para todo o Estado e para todo o Brasil. Uma zaragata medonha.
    Chico Cerveira, vendo-se preso, recalcitrou dizendo que aquela nota de cem mil réis não era dele, visto que havia feito o pagamento da boiada ao padre em boas notas de cinquenta mil réis.
    E mostrou o aludido recibo legal, a negregada ratoeira em que caiu o palerma do vendedor…!
    A polícia e o padre todos ficaram como os judeus em dia de Páscoa, vendo-se envolvidos em uma burla astuciosa e estupenda com que só o génio investigador do endiabrado Cerveira poderia vitimá-los.
    A Justiça Mineira, aos queixumes do queixoso, só sabia responder: – Agarra-lhe agora pelo outro lado! Ias buscar lã e ficaste tosquiado…»

     
  • topedrosa 18:30 on 20/02/2015 Permalink | Responder  

    Rua Aníbal Carreto 

    Sexta-feira, dia de greve nas escolas. Desejoso de não querer furar, nem sequer as greves, decidi lançar-me estrada fora desafiando as perspectivas de chuva. Fui visitar uma pessoa amiga que foi recentemente operada e qual não foi a surpresa quando vi a placa da rua onde mora.

    2015-02-20 10.54.59

    Já agora, sabem a que terra fui ?

    Escolhi repetir parte do caminho que fizemos no dia do Patrocinador. Fui até Aveiro, passando por Bustos, Palhaça, Quintãs, Aradas. O percurso faz-se bem, mas a estrada está em mau estado, é necessário ter muita atenção. Coincidência, quase a chegar a Aveiro, recebi uma chamada da direcção do Agrupamento para resolver uma situação urgente. Há que juntar o útil ao agradável. Fiz um pequeno desvio pela Homem Cristo. Assim  posso dizer que fui para o trabalho de bicicleta 😉

    Segui caminho na estrada junta à A25 até à Gafanha da Nazaré e, na rotunda, segui pela direita para fugir ao centro da cidade. Andamos lado a lado com a linha de caminho de ferro até à zona portuária. A estrada é boa e num ápice estamos junto ao Jardim Oudinot. A fome estava a apertar e que melhor destino para reabastecer poderia escolher ? Pois é, a nossa pastelaria na Costa Nova !

    Já recomposto, segui para a Vagueira e, grande erro, apanhei a direcção do Areão para não circular pela N109. Tive saudades do Corticeiro de Cima. É daqueles pisos que não rende, continuamente esburacado e remendado sobre cerca de 4 km. Mais valia o trânsito à semana da N109. Encontrei um colega de Aveiro a treinar para uma prova de BTT do circuito N GPS em Albergaria amanhã. Os concorrentes têm percursos entre 50 e 80 km nos quais a orientação é toda feita recorrendo ao GPS. Não há cronometragem da prova, o objectivo é o prazer de conhecer novos trilhos.  Assim fomos rolando e conversando até Mira.

    Poucos quilómetros depois, lá estava eu a comer a minha natinha na pastelaria Arcada. Troquei o café para um condensado de açúcar em líquido. Estava mesmo a precisar de algo para combater as cãibras. O resto da viagem foi feito devagarinho. Desta vez, foi uma volta com muita sorte, pois estava a chegar a casa e a chuva a começar a cair. Que bem me soube ouvir a chuva e eu, no computador, a registar 116 km.

     
    • nunorosmaninho 15:23 on 21/02/2015 Permalink | Responder

      O Informático-Ciclista foi desta vez Ciclista-Informático e passou por Couvelha, a terra de Aníbal Carreto. Será assim?

    • topedrosa 15:27 on 21/02/2015 Permalink | Responder

      Isso mesmo. Couvelha. Achei engraçado a coincidência. Para quando uma rua Joaquim Rosmaninho ?

    • nunorosmaninho 15:31 on 21/02/2015 Permalink | Responder

      Isso não me tinha ocorrido, nem sequer ao longe. Mas é uma grande ideia para uma pequena povoação. Lancemos um movimento, façamos uma petição, criemos justiça na memória dos homens!

  • nunorosmaninho 09:01 on 20/02/2015 Permalink | Responder  

    Protector da humanidade 

    O padre Moisés Nora, que foi vítima da habilidade de Chico Cerveira, reencontrou-se no Brasil com a sua fama e os seus feitos. Confesso: sem eles acharia menor o vulto do falsificador. A morte por cem contos é pura trafulhice. A compra da junta de bois é outra arte, finíssima. Hoje, vai o resto do diálogo travado nas Sete Fontes em 8 de Setembro de 1899. Recordam-se que o pároco de Cadima, ao ler no jornal que o Cerveira estava preso, se espantou quando o viu aparecer-lhe «de frente, na volta da ponte, montado em bicicleta, todo esgadelhado, suado e esbaforido». Eis o diálogo que se seguiu, rememorado pelo padre Moisés Nora:
    «– Olá, lhe disse eu admirado; adeus, meu grande amigo, então o senhor por aqui? Ora leia isto. Eu apontei-lhe a local, e ele leu… leu… e com uma presença de espírito que não sei descrever, responde, empertigando-se:
    – Qual?!… A justiça nada tem que fazer comigo. Eu sou um homem útil à sociedade e a justiça reconhece em mim tal benefício.
    – Retorqui-lhe logo: o que o meu amigo tem é uma bossa original para intrujar a humanidade… e um intrujão em tempo algum poderá ser classificado como um benemérito.
    – Eu não intrujo a humanidade; eu sou antes um seu verdadeiro protector…
    Como o caso se ia azedando, não o deixei avançar na perlenga. Assaltei-o logo com o facto de ele me ter falsificado uma certidão, o que levou o meu saudoso e prestantíssimo amigo dr. Perdigão, então juiz de Cantanhede, a chamar-me ao tribunal.
    Chico Cerveira riu-se escarninhamente e ultimou a nossa palestra com a seguinte avançada frase:
    – Eu imito sem custo a letra de todos os párocos destes nossos sítios; só os diabos daqueles gatafunhos do Prior de Sepins (Emídio Pereira) é que me têm dado que entender!… Mas também passam…
    – Está bom, lhe disse eu. Tenho pressa, é tarde e ainda hoje tenho de regressar a Cadima. Adeus; seja muito feliz nas suas empresas, mas lembre-se sempre do adágio: – Tantas vezes vai o cão ao moinho, que lá deixa o focinho!
    E com isto nos apartámos; sendo esta a última ocasião que falei com o célebre e famigerado Chico Cerveira.»

     
  • nunorosmaninho 09:01 on 19/02/2015 Permalink | Responder  

    Vaidade, atrevimento e predestinação 

    Em tribunal, o advogado Albano de Melo fez o retrato de Francisco Cerveira: vaidade, atrevimento e predestinação. «Este homem excepcional tinha o talento de falsificador de letras. Era um verdadeiro artista, com o génio da imitação, fazendo da pena, da pena flexível e branda na sua mão habilíssima, um instrumento criminoso. Ele jactava-se do seu talento e dos primores que saíam do seu trabalho. Falsificando, era um inspirado. Estudava o temperamento nervoso do homem pelos seus caracteres caligráficos, ele, que não conhecia nenhuma teoria, nem tinha nenhuma ciência, e acertava quase sempre fazendo criações prodigiosas. Tinha o orgulho do seu ofício e a paixão do nome de falsificador. Uma vez, em Aveiro, o comissário de polícia interrogava-o sobre a acusação, que lhe faziam, de forjar passaportes, e ordenou-lhe que escrevesse o nome do visconde de Alenquer, que era então governador civil do distrito, e cuja assinatura fora admiravelmente imitada em passaportes. Cerveira toma da pena e escreve o nome do governador civil com a mesma espécie de estremecimento, e com a mesma contracção nervosa, com que aquele funcionário costumava escrever, não conhecendo sequer de vista o falsificador a pessoa cuja letra imitava com uma exactidão maravilhosa! (Documento n.º 2 – depoimento do dr. Sanches da Gama.)»
    Diz o advogado Albano de Melo, cingindo-se ao depoimento de testemunhas da comarca de Viseu, que «Cerveira era o rival de Jacques Pires, outro artista inteligente, que fingia brilhantemente a letra estranha, reconhecendo os tabeliães, sem reparo, tudo quanto escrevia em nome de outrem.» Quem foi Jacques Pires? Francês? Em Viseu? Nada sei.

     
    • António 09:37 on 19/02/2015 Permalink | Responder

      Boa… o “episódio” hoje saiu mais cedo…
      Bem haja.

    • nunorosmaninho 10:40 on 19/02/2015 Permalink | Responder

      Amanhã, se não sair às nove, terá de ficar para a tarde. Vamos ter o padre Moisés Nora a conversar com o Chico Cerveira nos fornos das Sete Fontes. O falsificador queixa-se dos gatafunhos do prior de Sepins e intitula-se protector da humanidade. Que grande figura!

  • nunorosmaninho 13:46 on 18/02/2015 Permalink | Responder  

    Pirueta literária 

    O Escrivão nutre um interesse absurdo pela figura de Francisco Henriques Cerveira, como é notório. Não sabe explicar o motivo. Mas quando republicou os artigos que aqui vai partindo a seu bel-prazer, dispôs numa introdução catita factos soltos que talvez sejam o caminho para a aclaração.
    Chesterton terá dito que «o profeta e o charlatão são igualmente admirados durante uma geração, e admirados por más razões». Não foi para contrariar Chesterton nem o Venerável Homem da Mata que o Escrivão tirou o Cerveira do esquecimento. No entanto, andava o nosso herói traficando a sua arte pelo Brasil, desmoralizado talvez pelas agruras da prisão e da fuga, e na Place Maubert de Paris vivia outro falsário, imaginado por Umberto Eco em O Cemitério de Praga. Chamava-se Simonini, era antiquário e gostava de se vestir como abade Dalla Piccola. Um homem bateu à porta da sua decrépita loja. Queria «um testamento hológrafo, assinado por um tal Bonnefoy, a favor de um tal Guillot (ele, certamente). Tinha o papel de carta que usa, ou usava, aquele Bonnefoy e um exemplo da sua caligrafia.»
    Deixemos falar o falsário parisiense: «Fiz subir o Guillot ao escritório, escolhi a pena e a tinta adequadas, e, sem sequer fazer uma prova, produzi o documento. Perfeito.» Estamos a ouvir o Cerveira da Mealhada, não vos parece? «É belo produzir do nada um acto notarial, forjar uma carta que parece verdadeira, elaborar uma confissão comprometedora, criar um documento que levará alguém à perdição. O poder da arte…»
    É aqui que tocam as alegações jurídicas do advogado Albano de Melo. Serei parcimonioso a transcrevê-las.

     
  • nunorosmaninho 11:23 on 17/02/2015 Permalink | Responder  

    De Lisboa ao Rio de Janeiro 

    «O sr. António Marques ainda se demorou dois dias em Lisboa, e ao terceiro embarcou para o Brasil, indo Cerveira acompanhá-lo a bordo do paquete a despedir-se. Nunca mais se lembrou do que lhe havia contado o Cerveira, pensando até que era uma historieta inverosímil e falsa. Mas no Rio de Janeiro viu na Mala da Europa a notícia de que aparecera o testamento do visconde da Aguieira e nos tribunais havia uma demanda para o declarar suposto, e então acreditou que o Cerveira lhe tinha dito a verdade. E mais tarde leu nos jornais que esse testamento fora considerado falso.
    – Passaram-se anos, continua o sr. António Marques. No dia 17 de Agosto de 1899 ouvi bater à porta da minha casa no Rio de Janeiro. Lembro-me desse dia perfeitamente, porque nele adoecera gravemente uma pessoa da minha família. Abri, e aparece-me um desconhecido. Trocámos algumas palavras e reconheci o meu companheiro de viagem para Lisboa e do Hotel Sobral. Eu quis convidá-lo a jantar em minha casa, mas a doença dessa pessoa de família não mo permitia. Convidei-o a jantar em um hotel. Aceitou, e por sinal que o Cerveira, apesar de ser convidado, pagou, contra minha vontade, o jantar. Conversámos muito. Depois do jantar fomos dar um passeio [lapso no exemplar do jornal] que me lembrei do testamento do visconde da Aguieira. Falei nisso e disse-lhe que esse testamento não estava imitado com tanta perfeição que não fosse considerado falso nos tribunais:
    Cerveira respondeu:
    – Está muito enganado. O testamento não foi julgado falso por estar mal feito. Foi julgado falso por se descobrir que o papel, em que eu o escrevi, tinha sido fabricado em época posterior à da sua data, e a isto não se resiste.
    Mas, ouça: Deve aparecer uma carta, feita por mim, com letra e assinatura iguais às do visconde da Aguieira e em papel, que não tem o defeito do do testamento, que é uma maravilha de imitação. Essa carta é para considerar filho natural do visconde o Sousa, de Aveiro, carpinteiro, e é destinada a ser encontrada em casa da ama ou da pessoa que criou em Aveiro esse Sousa. (Aqui o sr. Marques hesita, não se recordando se Cerveira lhe falou na ama de Sousa se em outra pessoa.) A carta foi sugerida pela circunstância de o Sousa se parecer nos traços fisionómicos com o visconde da Aguieira, mas, apesar de não ter completa certeza disso, parece ao sr. António Marques que fora ele Cerveira quem lembrou ao Sousa, de Aveiro, o expediente da carta, que ele forjara, para ser julgado pelos tribunais filho e herdeiro do visconde da Aguieira, expediente que foi aceite, mas o sr. António Marques não pode dizer com segurança se foi Cerveira quem lembrou esse expediente se foi o próprio Sousa.
    O sr. António Marques Rodrigues de Carvalho regressou a Águeda em Abril de 1900, e aqui retomou a sua profissão de professor de ensino livre. Por esse tempo já nos tribunais se tratava da carta atribuída ao visconde da Aguieira e que o seu herdeiro, o sr. dr. Guilherme Teles, arguiu de falsa. Naturalmente, sabendo do que se passava, falou no que ouvira ao Cerveira no Rio de Janeiro e em Lisboa, e a primeira pessoa com quem conversou sobre isso foi com seu irmão, o sr. padre José Marques de Castilho, director da Escola de habilitação em Aveiro.»

     
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