Sendo nove da manhã, entrei de carro em casa do Patrocinador, com a bicicleta estendida na parte de trás. Já lá estavam o Vendedor e o Periglicófilo, chegaram logo após o Físico e os dois Informáticos e, sem tardar, o Rúben. A semana ensolarada, que aproveitei para andar mais de duzentos quilómetros, oferecia hoje a última oportunidade antes dos dias de chuva que se hão-de seguir. Só faltou o Peninha, outra vez. O Enólogo anda, com tristeza nossa, afastado destas lides.
A ideia de subir o Buçaco colheu um silêncio comprometido. Ninguém dizia que sim e ninguém dizia que não. Fomos portanto a Cantanhede, com uma larga volta sugerida pelo Vendedor que nos permitiu concluir a manhã com quase setenta quilómetros. Se tivesse ligado o famoso Strava, poderia agora enunciar com precisão o itinerário. Assim, só posso dizer que fomos até Covão do Lobo, inflectindo logo para Febres, por estradas ondeantes, rasgadas, ainda e sempre, pela instalação de água ou saneamento. Confluímos na variante que vem de Mira e seguimo-la, liderados pelo Rúben, até Cantanhede. Ninguém, excepto ele, pode dizer que está em boa forma. No entanto, de todos, é o Vendedor que parece ir adiante, tendo logo a seguir o Informático Motard, mais combativo desde que tem uma bicicleta nova.
Na esplanada, quase vazia por causa do frio, arrefecemos à medida que o céu nublava e o calor do esforço se esvaía. Definimos para meados de Fevereiro a peregrinação à ciclovia do Dão, por onde tantas vezes passou, de comboio, o grande Aquilino Ribeiro em trânsito para Lisboa.
Para dar amplidão à rota, fomos para sul até Portunhos, que a mim me lembra a pedra da Renascença coimbrã e ao Informático Motard o local do seu casamento. Andámos por sítios que conheço mal e que o Periglicófilo me foi explicando. Se tivesse levado a câmara desportiva, que tenciono prender estes dias ao guiador da bicicleta, teria registado o pequeníssimo mercado semanal da Cordinhã, que me pareceu perdido entre campos agrícolas, sobretudo desde que o apeadeiro ferroviário se inutilizou com o fim da passagem de comboios. Apetece sempre perguntar porque não assentam nessa extensa faixa abandonada uma ciclovia que lhe dê préstimo e perpetue a memória do comboio.
Antes de chegar a Sepins, o Vendedor convenceu-me de que seria mal-agradecido se não aceitasse a sua oferta de me limpar a bicicleta como um profissional. Primeiro, disse que não. Mas entre amigos a franqueza é uma variante da cortesia. Os atritos e solavancos na transição das mudanças podem resultar apenas da acumulação de óleo e poeiras. Assim, depois de uma passagem pelo Canto da Bicuda, na Antes, para comprar broa, que levei pendurada no guiador, como qualquer aldeão antigo, deixei a bicicleta no Patrocinador, onde, no próximo domingo, a encontrarei imaculada, como já uma vez aconteceu quando a pus nas mãos do Informático Ferroviário, que também adquiriu uma broa mas a aconchegou à barriga.
ANTÓNIO JOSÉ PIRES ROSMANINHO DOS SANTOS LOPES 16:07 on 31/01/2020 Permalink |
Muito bom!
nunorosmaninho 17:03 on 08/02/2020 Permalink |
Obrigado. Abraço!