A Primavera de 1932 chega ao fim. O entusiasmo desportivo mantém-se como uma força social. Há partidas de basquetebol, competições de tiro, desafios de futebol, provas de atletismo… E ciclismo? Em Coimbra, é o marasmo. Em «plena época do desporto do pedal», escreve um plumitivo preocupado, a cidade só viu «A volta dos campeões». Porque não há mais corridas? O que faz a delegação da União Velocipédica Portuguesa? Os seus membros estão inertes ou em desarmonia? Quem ousará proferir o «grito de ressurgimento»? Onde está um chefe salvador?
Vem o mês de Julho. Há bolas no cesto, remos na água, o Porto empata 4-4 com o Belenenses, os juniores correm para ganhar os oitenta metros, os trezentos, os mil, os três mil, estafetas, barreiras, saltos em altura, comprimento e vara, lançamento do peso, disco e dardo. Vêem-se automobilistas vaidosos, gincanas que premeiam com perfumes as acompanhantes, atiradores disparando sobre pobres pombos, enfim, tudo menos ciclismo.
17 de Julho é dia do Porto-Lisboa. Os corredores passariam em Coimbra pelas três da manhã. O júri de controlo, que ainda há poucos anos castigara o irascível Quirino, reúne-se outra vez no átrio da Câmara Municipal. A prova incluía «os melhores nomes do ciclismo nacional», mas esse título já não distingue os atletas de Coimbra.
– Então o Porto-Lisboa? – perguntei ao Anastácio.
O malandro encolheu os ombros. Não sabia nada e não tinha meio de lá chegar.
– Não estou a gostar de 1932 – disse-lhe num tom acusador.
– E se fôssemos à IV Corrida dos Campeões, na Figueira da Foz? É a 14 de Agosto.
– Tens a certeza?
– Não. Tudo se apresenta muito incerto.
E tão verdadeiro era o receio do Anastácio que, ao chegar à Figueira da Foz, encontrámos muitos veraneantes e, se o vocábulo não vos ofender, alguns peralvilhos. O Anastácio protestou.
– Essa palavra já não se usa.
– Uso-a eu.
– A palavra não é sua. Porque insiste?
Naquele tempo, o areal era mais pequeno, o bacalhau secava ao sol de Buarcos, ainda não haviam chegado os refugiados espanhóis, em breve Jorge encontraria Mercedes.
– Afinal, há ou não a IV Volta dos Campeões?
Anastácio voltou a encolher os ombros e apontou para o banco traseiro.
– Sei tanto como o senhor. Dei como certo o que li no jornal e enganei-me.
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